Moradores contam as melhorias em sua comunidade

Quatro antigos moradores da Boca do Rio, através de entrevista, relembram a vinda deles para o bairro, há quase 41 anos, e as principais transformações nele ocorridas, que o tornaram cada vez mais popular, como o desenvolvimento urbano, comercial e dos serviços

Há quase 41 anos, várias famílias se mudaram para a Boca do Rio por intermédio da doação de terrenos para a construção de residências destinadas aos moradores vindos de outras comunidades, como Alto de Ondina, realizada na gestão do então prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães. Essa transferência se iniciou em junho de 1969, quando, segundo o relatório Criação e formação do bairro da Boca do Rio, escrito por uma delas, dona Maria Estelita de Oliveira Rocha, “foram convidados a sair de lá para que a orla de Salvador fosse urbanizada, e então o prefeito ofereceu aos moradores dois lugares, (…) que eram os bairros de Engomadeira e o desconhecido bairro da Boca do Rio”.

Conheça, abaixo, um pouco sobre as quatro personalidades que participaram desta entrevista, realizada nos dias 25 e 27 de março. São alguns dos antigos moradores que contribuíram não somente a construir, a resgatar e a contar a história da comunidade onde elas vivem, mas também a melhorar e a ampliar a fisionomia e a qualidade de vida do local, e os serviços nele oferecidos. Em seguida, veja a entrevista propriamente dita.

Anatório da Rocha

Funcionário público estadual aposentado, trabalhava como garçom do Palácio de Ondina, residência oficial do governador do Estado da Bahia, atendendo vários governadores que ali residiam, de Luiz Viana Filho (1967-1971) a Paulo Souto (2003-2006). Luiz Viana Filho, por sinal, era o governador para quem o Sr. Anatório trabalhava em 1969, ano em que ele e sua família se transferiram para a Boca do Rio.

Aos 71 anos, é divorciado da também funcionária pública estadual Maria Estelita de Oliveira Rocha, de 64 anos, com quem tem seis filhos: Reginaldo (Regi), Ricardo (Guizão), Anatório Filho (Thouro), Helenice (Linda), Edson (Edinho) e o caçula André, nascido um ano após a mudança para a Boca do Rio, e que atualmente vive na Espanha. Apesar de estarem separados, eles moram juntos na mesma casa situada à Rua Professor João Carlos do Sacramento, 38, na Boca do Rio, desde 1969, ao lado de Ricardo, Helenice e Edson.

Eulina Silva Cerqueira

Natural de Campo Formoso, no norte da Bahia, é viúva, dona de casa e costureira domiciliar, e tem 75 anos. Ela se casou duas vezes, sendo a segunda com o funcionário público municipal aposentado Arízio Pires Moreira, falecido em 18 de novembro de 2000, aos 68 anos, que trabalhava como motorista particular de diversos prefeitos de Salvador. Do casamento com Arízio, ela teve três filhos: Arízio Filho (Arizinho), Domingos Sávio e Indaiá. Além disso, possui 25 netos e 10 bisnetos.

Dona Eulina, como é chamada carinhosamente por seus vizinhos e amigos, mora tranquilamente numa casa de número 36 da Rua Professor João Carlos do Sacramento, desde janeiro de 1970, levando uma vida simples e feliz.

Maria Estelita de Oliveira Rocha

Moradora da Boca do Rio desde 1969, vinda do Alto de Ondina, trabalha como agente administrativa do Colégio Estadual Pedro Calmon, no Jardim Armação, um dos bairros que lhe são próximos, desde a sua inauguração, em 1976, pelo então governador Roberto Santos. Quando da mudança dela e de sua família ao bairro, ele ainda não tinha nenhuma infraestrutura, e Dona Estelita, então com 24 anos, era apenas dona-de-casa.

Divorciou-se do funcionário público estadual Anatório da Rocha, que, apesar disso, eles vivem juntos. Aos 64 anos, tem cinco filhos, frutos do casamento com o sr. Anatório: Reginaldo (Regi), Ricardo (Guizão), Anatório Filho (Thouro), Helenice (Linda), Edson (Edinho) e André. Guarda, até hoje, um relatório que ela mesmo escreveu, contando as primeiras melhorias feitas no bairro, das quais foi testemunha. O relatório é intitulado Criação e formação do bairro da Boca do Rio.

Marinalva Silva de Oliveira

Aposentada desde 22 de dezembro de 2009, seu último emprego foi como auxiliar de serviços gerais do Colégio Sartre Coc (ex-Nobel), no Itaigara. Aos 60 anos, ela é casada há 45 com o pintor José Carlos Fernandes, de 67 anos, com quem tem um único filho, Roberto, de 43.

Assim como Dona Estelita e Sr. Anatório, Dona Marinalva e Sr. José, juntamente com Roberto, moravam em Ondina, e se mudaram para a Boca do Rio ocupando um terreno obtido por doação feita em 1969, pelo então prefeito Antônio Carlos Magalhães. Sua casa, localizada na Travessa Professor João Carlos do Sacramento, 37, era, a princípio, modesta, mas com o tempo foi se ampliando.

Como surgiu o bairro da Boca do Rio?

Anatório da Rocha – Nós, quando chegamos aqui, já tinha a Boca do Rio. Quando nós saímos da Ondina, viemos para este bairro pelo prefeito Antônio Carlos Magalhães. Nós chegamos aqui à Boca do Rio, praticamente. Então, a gente chegava aqui, saltava em frente à sede de praia do Esporte Clube Bahia. Hoje, a Boca do Rio é um paraíso. Nós chegamos aqui no ano de 1969. Hoje, o comércio do bairro é fabuloso, onde tudo que você procura você encontra. Só que a violência está uma coisa sem controle. E a única coisa que mete medo é a violência.

Quais foram as primeiras melhorias aqui realizadas?

Marinalva Silva de Oliveira – Quando prefeito, ACM doou terrenos para a construção de casas destinadas a moradores vindos de Ondina. Antes disso, ele já havia mandado montar, a toque de caixa, vários barracos na Rua Hélio Machado, destinados a moradores egressos do “Bico de Ferro”, uma invasão à beira-mar na Pituba, recém-demolida à época para dar espaço ao Jardim dos Namorados. Os novos ocupantes dos barracos eram, em grande parte, pescadores.

Por que moradores de outros bairros se mudaram para a Boca do Rio?

M. S. O. – Porque aqui é um dos melhores bairros, por ser localizado perto da Orla, onde tem shoppings, como o Aeroclube, e praias.

Quais foram os primeiros estabelecimentos comerciais a surgir?

A. R. – Começou com barracas de verduras, depois vieram depósitos de materiais de construção, açougues, padarias, armarinhos, quitandas. Mais tarde, surgiu o primeiro supermercado, o Paes Mendonça (hoje Bompreço) e, em seguida, a Cesta do Povo.

Por que o comércio se desenvolveu bastante no bairro?

Eulina Silva Cerqueira – Porque aqui é muito distante do centro, e então a pessoa precisa de alguma coisa para comprar aqui mesmo. Quando nós viemos aqui, não havia banco, médico, luz – era muito fraquinha, pois a prefeitura a instalou, e não eram todas as pessoas que conseguiram obter energia elétrica. Depois, a Coelba colocou postes, fiação, e ligou a luz, que foi uma “festa” na Boca do Rio. Também não tinha asfalto, pois só era barro batido.

Quais foram os postos de saúde a surgir no bairro?

E. S. C. – O primeiro posto de saúde foi aquele de lá de baixo, o César de Araújo. Também tem um outro, no (Parque Residencial Guilherme) Marback, o Dr. Alfredo Bureau, onde agora tem emergência 24 horas, que antes não tinha.

Qual foi a primeira escola pública a surgir na Boca do Rio? Na época da sua inauguração, ela teve qual finalidade?

Maria Estelita de Oliveira Rocha – Na minha opinião, quando a gente chegou, foi o Agnelo de Brito (municipal). Foi construída para os filhos dos moradores vindos de Ondina estudarem.

Como as ruas foram pavimentadas?

E. S. C. – Era um asfaltozinho só no fim de linha, para que os ônibus chegassem até lá. Todas as outras ruas não tinham pavimentação. Depois, é que os prefeitos foram ajeitando as ruas com a ajuda de políticos, como José Raimundo (ex-vereador, hoje falecido), Marcelo Guimarães (ex-deputado estadual e ex-presidente do Esporte Clube Bahia), e outros. Isso não deixa de ser obra eleitoreira.

Dona Estelita, a senhora acompanhou o surgimento dos serviços públicos nesta comunidade?

M. E. O. R. – Acompanhei. Asfalto, luz, água, o desenvolvimento de tudo.

O Imbuí pode ser considerado um bairro, independente da Boca do Rio?

A. R. – Pode sim, tanto é que tem o nome. O Imbuí também, praticamente, faz parte da Boca do Rio. Mesmo com essa violência que está existindo na Boca do Rio, o Imbuí ainda é um dos lugares um pouco mais sossegados.

M. E. O. R. – Eu acho que não. Tudo o que eles falam é Boca do Rio/Imbuí. Na minha opinião, não é um bairro independente, pois é só Boca do Rio. Na placa dos ônibus, a gente vê Boca do Rio/Imbuí.

Quais foram as consequências do desenvolvimento do bairro?

M. S. O. – O bairro melhorou muito. Tem tudo. Se a gente não quiser ir à cidade, não tem necessidade, porque tem bancos, mercados, lojas de móveis, armarinhos, mercadinhos, e outros. Temos ônibus, que antigamente não tinha, e que a gente pegava ou na Orla ou na Bolandeira. Hoje em dia, tem 2 postos de saúde, sendo que um possui emergência, e tem laboratórios pagos pelo Sus (Sistema Único de Saúde). Quanto às negativas, só a violência cresceu um pouco, mas com tudo isso, é um bairro muito bom.

O crescimento da Boca do Rio favoreceu a integração com os bairros adjacentes?

M. E. O. R. – Sim, através da infraestrutura (energia, transportes, água e esgoto, telecomunicações), da melhoria da qualidade de vida, do comércio e dos serviços.

Como testemunha da evolução da Boca do Rio, a senhora conheceu algum prefeito que colaborou nesse processo? O que eles fizeram?

M. E. O. R. – Mário Kertész e Fernando José. Eles asfaltaram as ruas, sendo que metade das ruas, nem todas.

O que a senhora acha do convívio e da amizade com outros moradores de sua geração?

M. E. O. R. – O convívio é excelente. São excelentes amigos.

Como antigos moradores do bairro, como é que os senhores se sentem em relação a ele?

A. R. – Como morador antigo do bairro, me sinto maravilhoso, excelente e espetacular e, graças a Deus, não tenho nenhum inimigo.

M. S. O. – Me sinto bem. É um bairro bom, onde tem tudo. Mesmo com toda violência, é um bairro onde a gente vive bem.

M. E. O. R. – Bem. Gosto muito.

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